Renato Benvindo Frata
Li em “Luas Novas e Antigas” de Mara Senna, o poema que nominou o livro: “Eu guardo luas nas gavetas do meu quarto crescente. / Luas novas e antigas, luas de rir e de chorar. / Luas tão velhas amigas, luas de todo lugar. / Luas distantes, luas perdidas, ocultas em noites de eclipse lunar. / Vou guardando na gaveta toda lua que encontrar. / Ainda ontem, achei a lua cheia, que um dia avistei sobre o mar./ Noutro dia, a lua minguante, aquela que me viu chorar. / E, anteontem, uma lua crescente, sabedora das coisas que vão melhorar. / Vou guardando luas novas e antigas. / Meu caminho é lunar.
Depois li “Ouvir Estrelas” de Olavo Bilac, o conhecidíssimo soneto em que o poeta relata ter se levantado, aberto a janela para, especialmente, ouvir estrelas e conversar com elas pela noite toda, até que o sol com seu clarão, as apagasse de sua vista levando-o a também se recolher, mas guardando para si uma paixão por alguém cujo nome não revela.
Simplificando a análise, com Mara vejo que a preocupação é a mesma de Bilac quando diz “guardar as luas na gaveta” – que simboliza memória, para que possa se lembrar dos momentos felizes e também dos tristes numa relembrança contínua que a impele a procurar equilíbrio com respeito a amores. Faz da lua, em sentido figurado, a tônica que a mantém na eterna tarefa de busca a uma satisfação de vida-felicidade.
Mara e Bilac, em épocas distantes, (separados por mais de cem anos), deixam-se levar pelo eu-lírico de devaneio, com ela admirando e escolhendo a lua como sua metade romântica a ponto de guardá-la em si hermeticamente fechada; e ele, da mesma forma, elegendo as estrelas da Via-Láctea confidentes nas conversas à madrugada. Ambos, nesse anseio, para dizer da paixão que têm dentro de si e os estimula via olhares contínuos ao céu à espera de respostas aos seus estímulos, até encontrarem a satisfação plena que o amor verdadeiro, por certo, propicia, e que tanto almejam.
A insatisfação pessoal, talvez, com o íntimo sentimento de vazio a lhes povoar a alma pela falta de alguém que os complete, levam-nos a olhar seguidamente os astros e a se embevecerem com e por eles, transcrevendo essas emoções para a posteridade.
Os versos regados à paixão emparedada tendem a transparecer, e deixam vazar pelas bordas dos sentimentos o afeto que nutrem e não são correspondidos, mas que o âmago da noite absorve no mais especial silêncio que a solidão permite. Em forma de cicio às vezes e de balbucio em outras, ambos do amor crescido teimoso que alcança essa borda, escorre e se espraia sob a espuma do querer. Lindos, são ambos os poemas.
Nesses tempos loucos em que vivemos, enclausurados em nossos lares sem nos permitir contatos amiúdes com amigos, parentes e vizinhos, em que o medo de receber e espalhar nocividade que a pandemia rega sobre todos, talvez olhar para o céu seja um lenitivo. A ele poderemos contar os segredos que nossos corações armazenam e mantêm trancados, com a certeza de que, de forma terna e segura serão mantidos, assim como nos manteremos vivos sem nos julgarmos loucos, mas, poetas!
Mais um belo texto, Renato, obrigado por nos presentear com tanta poesia!
Renato Frata
BENDITA seja sua fonte inesgotável de inspiração .