Vozes do Silêncio

Publicado em 17 de julho de 2021

Renato Benvindo Frata
O silêncio tem vozes imperceptíveis que passam despercebidas; e outras, gritantes, são audíveis ao coração de onde explodem sentimentos.
A essas vozes, a tristeza sempre acompanha.
O pátio escolar guarda gritos deixados e cria pontos de interrogação. Por quê, mamãe, a escola fechou? Vozes ecoam ainda no que restou de alegria em rabiscos nos painéis, no grito do giz não apagado, nos arranhares de riscos tingindo a parede, nos garranchos de incerteza de cadernos que a tia guardou.
Até quando? Ninguém sabe.Guardam o silêncio também grades que mantêm gigantes comprimidos nos vai e vêm do pequeno espaço nos circos, e nas gaiolas nos alpendres independentemente de cantares ou rosnares. É a solidão que ecoa… na voz magoada, insegura, persistente da clausura.

Guardam silêncio as residências de ar pesado sobre corpos e cabeças pelo recolhimento forçado… tudo ficou difícil, o social foi apagado. Impõem-se mudança completa e irrestrita de comportamentos. Silêncios sentidos. Silêncios vividos. Silêncios não respondidos… Silêncio, apenas. E olhos tristes, tez compenetrada pelo medo a rondar.
Como os de agonia da mãe à beira do berço pela incerteza da cura, de filhos às cadeias pela falta de opção, de famílias em hospitais pelas iminentes perdas, do trabalhador com a carteira encerrada pela falta do pão da sobrevivência.
Gritos do silêncio na agonia do patrão com folhas não pagas, com empregados que não podem comer o estoque. Nem seus credores. Tudo mudou. O silêncio abafa vozes… e criam suspiros de dor, íntimos, extraídos do âmago, deixados ficar empapando-se em suores, e que, teimosos, vertem e rolam em gotas de sal do desespero.
Às vezes tremor, às vezes temor calado. Tão silente quanto.
Lá fora o vento sopra sem ser sentido, a brisa morna passa sem encontrar rostos, a flor brota e se abre sem ser apreciada, a borboleta esvoaça envergando asas magistrais, mas segue sem ser perseguida pela criança feliz que a acompanharia em saltos e gritos no jardim. Está presa, não pode sair. Ninguém deve.
Silêncios que a nós é dado somente para escutar… e silenciar com ele.
O silêncio imposto pela Covid não merece resposta.
Ah, doença nojenta! Como é sem graça e impertinente.
Nunca nos convide para seu abraço.

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