Joãozinho era um menino ruim que só fazia malvadeza e se gabava com elas. Se lhe caía às mãos um gato, logo o deixava sem rabo; se fosse um cachorro, picotava suas orelhas; da caranguejeira arrancava algumas pernas deixando-a a se arrastar; as meninas na escola corriam apavoradas quando lhes punha baratas nos cabelos e até a professora volta e meia se deparava com lagartixas nas gavetas. Um horror o endemoniado. Próximo de nós morava o Capitão Gustavo, um ex-combatente cego por ferimento, na Segunda Guerra. Gostava de perambular diuturnamente apoiado em uma bengala comprida cuja finalidade era pelo meio tátil, assegurar-se do bom caminho. Como a cidade era pequena, passava sempre pelos mesmos lugares, e assim ia e voltava sem dificuldade. Pois não é que Joãozinho, pé ante pé, colocou pedras no trajeto do Capitão? Com o desiquilíbrio estrebuchou-se aquele no chão, enquanto o moleque ria.
Joãozinho, comprovou-se, era mau de espírito, dotado de total falta de consciência, respeito, civilidade, compaixão, decência. Seu desvio de caráter era mesmo uma espécie de loucura a merecer tratamento sério. Até que certo dia o levaram para um sanatório e de lá nunca saiu.
Sabíamos que o candidato Bolsonaro não era o ideal para o Brasil em 2018. Seus defeitos estampados na vida política o diziam e reprisá-los não é preciso. Sabíamos que raramente usou de gentilezas, mesuras e rapapés no trato com pessoas e que sua educação e civilidade deixava muito a desejar e que é dado a insultos e palavrões, rispidez e brutalidade; e que também à época, respondia a um porre de processos dado à sua postura rude e de caverna. Nenhum desses processos, porém, apontava ter ele se locupletado de bens do erário ou participado de falcatruas em seu benefício.
Comparando-o com os demais candidatos (não é necessário lhes citar nomes nem currículos), o resultado foi o esperado. O Brasil votou e a maioria deu um basta à bandalheira crendo na promessa de bem servir, e que suas intenções superariam qualquer dor de cabeça advinda da inconstância de humor, arrogância, agressividade, marra, valentia, teimosia e de todos os adjetivos que lhes possam dar, inclusive a de cego que não enxerga a majestade do cargo que ocupa.
Só que as coisas não ficaram como desejadas: a oposição partidária, cuja maior força se encontra arraigada no Congresso e continua a manter avidez pelas tetas da máquina pública, impede/dificulta que mudanças propostas para a consecução de seu plano de governo sejam retardadas, especialmente com a não votação a tempo de Medidas Provisórias, Projetos de Leis e Leis necessárias ao cabal desempenho governamental. Isso para não falar do Judiciário que desde sempre danou a interpretar por linhas tortas palavras, gestos e ações do Poder Executivo, como a querer governar em seu lugar.
Hoje, em plena pandemia Covid-19 que nos impõe dobrados cuidados para nos mantermos vivos inseguros e intranquilos, vemos a sociedade desprovida dos mínimos direitos sociais como trabalho, moradia, saneamento e decência, e nos deparamos diariamente com confusões geradas e alimentadas pelo desejo de Poder das três esferas de governo que não se respeitam e nem aos limites constitucionais. Promovem nesse caos a falência da saúde, a pequenez da economia e a bandalheira da política, desnecessárias no momento em que a união da população e autoridades se fazem urgentes para a causa maior: a solução desses problemas. A exemplo de Joãozinho, espalham pedras à espreita de tombos nos passos tateados à bengala, sem se dar conta que assumem por inteiro a qualidade desprezível daquele menino.
Que movimentos sociais, como o “Manifesto Estamos juntos”, lançado ontem por milhares de pessoas, possam abrir os olhos gananciosos dos nossos representantes… e os faça limpar a lambança que estão a promover neste país. …
Renato Benvindo Frata