A voz do travesseiro

Publicado em 10 de agosto de 2015

Harold D. Lasswell, um dos fundadores da psicologia política, analisando hábitos etílicos de políticos de sua terra, disse que “a consciência é a parte psíquica que se dissolve em álcool”. Ouso acrescentar, analisando o comportamento de alguns de nossos empresários no relacionamento com o Governo, que outro elemento capaz de dissolver a consciência com a mesma desenvoltura é o dinheiro fácil. Logo, álcool e dinheiro em excesso são perniciosos.
A soma do dinheiro desviado é descomunal, e chegava ao destino como resultado de acordos de geniais estratégias com o envolvimento de pessoas ligadas ao Poder. Armações fantásticas foram arquitetadas minuciosamente para o golpe.
Diante dessa balbúrdia em que se transformou nossa economia e o descalabro em que se meteu o Governo, cenas deprimentes são focadas pela televisão para o mundo ver: bem vestidos, vovôs de calvas grisalhas – entre 50 e 70 anos desfilam – cada qual em dia e lugar próprios – levados, mãos às costas, atadas por grossas algemas, resultado do “cair da casa” no jargão policial, – com as condenações do Mensalão, agora com o Petrolão e já, já com o Eletrolão e BNDES.
É de arrepiar. Seus cabelos brancos, símbolo da experiência de vida e da sabedoria que deveria ser exemplo para filhos e netos em biografias contundentes pelo sucesso cultural e patrimonial que amealharam, representam nesses momentos, velhice com dose de velhacagem.
Diante de tanta indignidade – da situação que criaram para o país em termos administrativos e de sustentabilidade governamental, – um sentimento misto de pena, pesar e repugnância se aflora; e nada há que fazer senão esperar pelo desfecho que está longe de chegar, pois a cada minuto surgem novas notícias ruins. Nesse vai da valsa que comanda o tempo, vem-me à memória o termo consciência enquanto percepção do moralmente certo ou errado em atos e motivos individuais.
Chego a questionar se os homens de bem, envolvidos nesses escândalos, poderão ter se esquecido de se consultar com a consciência antes de usarem “mão de gato” no dinheiro, porque a regra moral é simples: a consciência é a almofada mais fofa para ser usada durante o sono restaurador. Mas, quando desprezada, se transforma em pedra-ferro de corte irregular, especialmente durante as tempestades: machuca, fere, magoa, cobra postura, acusa e passa na face do indivíduo uma película de vergonha. E de arrependimento.
Por falar em tempo ruim, é bom lembrar que “não existe testemunha mais terrível – ou acusador mais poderoso – que a consciência que habita em nós” . Ela gravita o travesseiro, apossa-se dele, transforma-o cimentando suas bordas, e o deixa deveras falante nas horas que deveria se calar, nas horas em que o silêncio da madrugada poderia ser o lenitivo dos malfeitos, já que esses vovôs são vítimas e vilões ao mesmo tempo. De achaques e de conluios.
Resta saber se têm eles discernimento de que “uma pessoa não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupada a fazer o errado em outra, pois a vida é indivisível” – como disse gandhi, porque o travesseiro que abriga os pensamentos assume o que dita a consciência, e consegue bombardear as horas de sono com a aspereza grosseira das palavras da razão.
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1 Sófocles.

Por: Renato Benvindo Frata

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4 comentários sobre “A voz do travesseiro

  1. Belíssima crônica, Renato. Sou fã de seus escritos.

    Diante de suas palavras no texto você acabou conduzindo-me à lembrança dos inesquecíveis “Velhinhos Transviados” da década de 60*… É o que, a meu ver, são esses ‘hóspedes” do iusmaestro Moro, que tem conseguido, antes de recebê-los na ‘hotelaria especial’, fazê-los cantar nos chuveiros de casa:

    “De que vale o céu azul e o sol sempre a brilhar
    Se você não vem e eu estou a lhe esperar
    Só tenho você no meu pensamento
    E a sua ausência é todo o meu tormento”…

    Aí quando chegam os rapazes de preto da PF e batem às portas, tudo desafina sob os chuveiros dourados desses “Velhinhos Transviados” tão bem acomodados em Curitiba.

    Parabéns pela crônica, e desculpe a brincadeira. Abs

    * https://youtu.be/S_IxJCGAn6c

  2. Caro Dr. Renato. O senhor está certo em sua reflexão. O significado de retidão, de honra, de dignidade e principalmente de cidadania foi banalizado. O mais triste é a convicção de que a maioria destes crápulas, inimigos da nação, vão continuar parasitando e sugando o sangue do trabalhador brasileiro, com o aval, pelo voto, e pela ignorância dos nossos irmãos descamisados, de roupas, de pão e principalmente de cultura.
    E assim continuará até que os vomitemos de nossa vida pública!

  3. ZECA DIRCEU VISITA O PAI NA CARCERAGEM DA PF EM CURITIBA. GLEISI HOFMANN E ENIO VERI, PROMETERAM UMA VISITA EM BREVE AO VELHO AMIGO

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